O despertador tocou às
sete horas da manhã em ponto. Era mais uma Segunda-Feira onde ele iria ter que se
arrastar para seu trabalho e morrer lentamente durante horas fazendo coisas que
não gostava, param enfim, se arrastar novamente para sua casa e dormir.
Levantou-se e viu o pequeno quarto todo bagunçado. Roupas e sacolas espalhados por todo o canto. Vestiu a primeira camisa que alcançou ( mesmo essa estando com uma pequena mancha de molho de tomate da semana passada nas mangas) e foi até a cozinha preparar seu elixir matinal, café preto e fervendo.
Sentado e olhando
fixamente para a parede branca da cozinha, bebericava o líquido esfumegante,
pensando: “Como foi que a perdi? Talvez eu mereça... Sou um lixo ao final das
contas. O que uma garota como aquela iria querer comigo? Falido, sem graça, sujo,
feio... Não me surpreende minha mãe ter me deixado aos oito.”.
Coçou a barba por
fazer antes de se levantar largar a xícara junto com a pilha de louças para
lavar e caixas de pizza, foi quando...
- Você devia fazer
uma faxina nesse lugar! E por favor, faça a barba e penteie o cabelo.
O resto de café foi
derramado na calça amassada com o susto que tomou. Os olhos arregalados dele
ainda procuravam a fonte daquela voz, mas ninguém estava lá. Estava ainda
dormindo? Ou ficou louco de vez?
- Aqui embaixo, seu
doido! Está tão depressivo que esqueceu que moro aqui também?
Cautelosamente os
olhos dele se abaixaram e avistaram o cachorro branco e marrom sentado à sua
frente o encarando. Mas que porra que estava acontecendo? O cachorro estava
falando?
- Eu até gostava de
você quando a Mamãe me trouxe para cá, mas agora que ela foi embora você não me
dá mais bola. Estou sem passear faz dias e minha caminha está toda
bagunçada....Ah! Aquele cocô na sala eu não sei quem fez, mas aposto que foi o
porteiro! Ele sempre vem aqui de manhã deixar um jornal naquela pilha que você
nem mais olha.
O cachorro olhava
para ele, sorrindo. Sim! Sorrindo! Enquanto abanava o rabinho. O homem estava
boquiaberto, mas nada conseguia dizer. Paralisado, apenas apontava pro animal
com o dedo tremulo.
- Bom, agora que
tenho sua atenção, vá se arrumar e trabalhar. Chega desse melodrama que você
vai se atrasar de novo. Ela te deixou por que não tinha mais nada o que
prolongar nessa relação. Toma rumo na vida, cara! Éramos parceiros, brincávamos juntos,
você acariciava minha barriga e a gente assistia filmes juntos! Agora você me
joga uma ração quando chega e só!
Ainda sem entender
bem como reagir, ele se arrumou e saiu para trabalhar. As horas no serviço
passaram voando imaginando, mas que merda tinha sido tudo aquilo. O cão havia
dado uma dura nele. Pior! O cão tinha FALADO com ele.
Ao voltar do
trabalho, abriu a porta devagar. Quem sabe não aparecia um periquito e também
trocassem uma idéia. Mas o que encontrou foi apenas a mesma casa toda suja e
bagunçada. Assobiou, chamou o animal e este não apareceu. Logo sentou-se no espaço
que encontrara livre no sofá e tentou raciocinar.
- Ah! Que bom que
chegou! Está aqui a vassoura e a pazinha. Pode começar a limpeza pela sala.
O cachorro, com a
boca, jogou aos pés do dono os objetos e voltou a abanar o rabo. Agora o animal
estava mandando ele limpar a casa.
- Se quiser eu te
ajudo, mas estou louco para brincar com a minha bolinha!
O homem pegou a
vassoura e a pá e começou a faxina, agora já aceitando sua loucura. Por mais que
aquilo fosse algum problema mental da sua parte, o ego/canino estava certo.
Enquanto varria o chão, via o pequeno serzinho correndo para lá e para cá com a
sua bolinha. Poderia jurar que estava muito feliz do dono estar voltando a
ativa. Seguindo para seu quarto, trombou com o animal saindo do banheiro e com
um pedaço de papel higiênico preso na patinha traseira.
- Banheiro
interditado. Acho que o porteiro passou por lá também.
Aquilo tudo era
muito para sua cabeça. Será que era uma pegadinha da sua antiga amada? Ou
realmente estava completamente biruta? Quando foi levar as roupas sujas para
lavar, viu o cachorro colocando o telefone sem fio na bancada.
- Eu ia cozinhar
para nós, mas lembrei que não sei cozinhar e nem alcanço o fogão. Então pedi
comida chinesa para nós. Gosta de yakissoba né?
Após uma hora,
enquanto pendurava as roupas no varal, o interfone tocou e o cachorro junto a
vários latidos gritava: “A comida chegou! A comida chegou!”. Ambos se sentaram
na mesa para comerem e o homem encarava ainda em silêncio o animal que parecia
um esfomeado engolindo enormes pedaços de frango xadrez.
- Diga-me, faz
quanto tempo que você fala?
O cachorro, com um
pedaço de repolho pendurado na boca e mastigando de boca aberta respondeu: - Na
verdade eu sou um anjo vindo do Paraíso personificado em cachorro para te tirar
dessa depressão que irá lhe destruir.
- Sé..sério?
- Óbvio que não! Só estou
brincando com a sua cara! Sou só um cão normal.
- Mas você fala...
- Todos nós falamos,
só que vocês, humanos, não nos escutam. Se parassem para nós por um minuto se
quer, veria que somos muito mais comunicativos e atenciosos que vocês mesmo. Me
passa o molho de soja?
O homem continuou a
encarar o animal, respirou fundo e aceitou de vez a situação voltando a comer o
rolinho primavera.
O tempo foi-se
passando e as rotinas com o seu novo amigo canino também. Sempre estavam juntos
e tagarelando um com o outro sobre o que fizeram ao longo dos dias enquanto cuidavam
da casa. O homem mudou sua aparência e descobriu que seu amigo amava correr no
parque ao lado. Já o cão descobriu que as visitas do porteiro deveriam se
limitar na área de serviço e que muitos latidos também não eram bem-vindos.
Com os meses
passando, o homem começou a namorar de novo. Uma linda e interessante garota.
Obviamente seu cão teve que aprova-la e o ajudou muito em conselhos de
comportamento e higiene (quem diria...). Eles ficaram noivos e o cão voltou a
ter uma Mamãe como ele gostava de dizer. Até de vez em quando eles dormiam
juntos, os três abraçadinhos.
E assim, dois amigos
voltaram a se conhecer e se amar. O homem saiu de seu buraco negro e profundo
de tristeza, já o cão teve a companhia que merecia e que tanto presava.
Aliás, eu acho que o
cão é o herói da história. Eu deveria ter terminado dizendo que eu iria virar
um supercão e ter várias cadelinhas,...errr...quer dizer...que o CãO viraria um
super-herói.
Bom, essa minha
história, ops, história sobre esses amigos termina por aqui. Agora preciso
conversar com uma certa pessoa que trouxe um gato pulguento pra casa...ARGH!
Odeio aqueles felinos!
André Bludeni

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