segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

O Cão e o Homem

  O despertador tocou às sete horas da manhã em ponto. Era mais uma Segunda-Feira onde ele iria ter que se arrastar para seu trabalho e morrer lentamente durante horas fazendo coisas que não gostava, param enfim, se arrastar novamente para sua casa e dormir.

  Levantou-se e viu o pequeno quarto todo bagunçado. Roupas e sacolas espalhados por todo o canto. Vestiu a primeira camisa que alcançou ( mesmo essa estando com uma pequena mancha de molho de tomate da semana passada nas mangas) e foi até a cozinha preparar seu elixir matinal, café preto e fervendo.

  Sentado e olhando fixamente para a parede branca da cozinha, bebericava o líquido esfumegante, pensando: “Como foi que a perdi? Talvez eu mereça... Sou um lixo ao final das contas. O que uma garota como aquela iria querer comigo? Falido, sem graça, sujo, feio... Não me surpreende minha mãe ter me deixado aos oito.”.

  Coçou a barba por fazer antes de se levantar largar a xícara junto com a pilha de louças para lavar e caixas de pizza, foi quando...

  - Você devia fazer uma faxina nesse lugar! E por favor, faça a barba e penteie o cabelo.

  O resto de café foi derramado na calça amassada com o susto que tomou. Os olhos arregalados dele ainda procuravam a fonte daquela voz, mas ninguém estava lá. Estava ainda dormindo? Ou ficou louco de vez?

  - Aqui embaixo, seu doido! Está tão depressivo que esqueceu que moro aqui também?

  Cautelosamente os olhos dele se abaixaram e avistaram o cachorro branco e marrom sentado à sua frente o encarando. Mas que porra que estava acontecendo? O cachorro estava falando?

  - Eu até gostava de você quando a Mamãe me trouxe para cá, mas agora que ela foi embora você não me dá mais bola. Estou sem passear faz dias e minha caminha está toda bagunçada....Ah! Aquele cocô na sala eu não sei quem fez, mas aposto que foi o porteiro! Ele sempre vem aqui de manhã deixar um jornal naquela pilha que você nem mais olha.

  O cachorro olhava para ele, sorrindo. Sim! Sorrindo! Enquanto abanava o rabinho. O homem estava boquiaberto, mas nada conseguia dizer. Paralisado, apenas apontava pro animal com o dedo tremulo.

  - Bom, agora que tenho sua atenção, vá se arrumar e trabalhar. Chega desse melodrama que você vai se atrasar de novo. Ela te deixou por que não tinha mais nada o que prolongar nessa relação. Toma rumo na vida, cara! Éramos parceiros, brincávamos juntos, você acariciava minha barriga e a gente assistia filmes juntos! Agora você me joga uma ração quando chega e só!

  Ainda sem entender bem como reagir, ele se arrumou e saiu para trabalhar. As horas no serviço passaram voando imaginando, mas que merda tinha sido tudo aquilo. O cão havia dado uma dura nele. Pior! O cão tinha FALADO com ele.

  Ao voltar do trabalho, abriu a porta devagar. Quem sabe não aparecia um periquito e também trocassem uma idéia. Mas o que encontrou foi apenas a mesma casa toda suja e bagunçada. Assobiou, chamou o animal e este não apareceu. Logo sentou-se no espaço que encontrara livre no sofá e tentou raciocinar.

  - Ah! Que bom que chegou! Está aqui a vassoura e a pazinha. Pode começar a limpeza pela sala.

  O cachorro, com a boca, jogou aos pés do dono os objetos e voltou a abanar o rabo. Agora o animal estava mandando ele limpar a casa.

  - Se quiser eu te ajudo, mas estou louco para brincar com a minha bolinha!

  O homem pegou a vassoura e a pá e começou a faxina, agora já aceitando sua loucura. Por mais que aquilo fosse algum problema mental da sua parte, o ego/canino estava certo. Enquanto varria o chão, via o pequeno serzinho correndo para lá e para cá com a sua bolinha. Poderia jurar que estava muito feliz do dono estar voltando a ativa. Seguindo para seu quarto, trombou com o animal saindo do banheiro e com um pedaço de papel higiênico preso na patinha traseira.

  - Banheiro interditado. Acho que o porteiro passou por lá também.

  Aquilo tudo era muito para sua cabeça. Será que era uma pegadinha da sua antiga amada? Ou realmente estava completamente biruta? Quando foi levar as roupas sujas para lavar, viu o cachorro colocando o telefone sem fio na bancada.

  - Eu ia cozinhar para nós, mas lembrei que não sei cozinhar e nem alcanço o fogão. Então pedi comida chinesa para nós. Gosta de yakissoba né?

  Após uma hora, enquanto pendurava as roupas no varal, o interfone tocou e o cachorro junto a vários latidos gritava: “A comida chegou! A comida chegou!”. Ambos se sentaram na mesa para comerem e o homem encarava ainda em silêncio o animal que parecia um esfomeado engolindo enormes pedaços de frango xadrez.

  - Diga-me, faz quanto tempo que você fala?

  O cachorro, com um pedaço de repolho pendurado na boca e mastigando de boca aberta respondeu: - Na verdade eu sou um anjo vindo do Paraíso personificado em cachorro para te tirar dessa depressão que irá lhe destruir.

  - Sé..sério?

  - Óbvio que não! Só estou brincando com a sua cara! Sou só um cão normal.

  - Mas você fala...

  - Todos nós falamos, só que vocês, humanos, não nos escutam. Se parassem para nós por um minuto se quer, veria que somos muito mais comunicativos e atenciosos que vocês mesmo. Me passa o molho de soja?

  O homem continuou a encarar o animal, respirou fundo e aceitou de vez a situação voltando a comer o rolinho primavera.

  O tempo foi-se passando e as rotinas com o seu novo amigo canino também. Sempre estavam juntos e tagarelando um com o outro sobre o que fizeram ao longo dos dias enquanto cuidavam da casa. O homem mudou sua aparência e descobriu que seu amigo amava correr no parque ao lado. Já o cão descobriu que as visitas do porteiro deveriam se limitar na área de serviço e que muitos latidos também não eram bem-vindos.

  Com os meses passando, o homem começou a namorar de novo. Uma linda e interessante garota. Obviamente seu cão teve que aprova-la e o ajudou muito em conselhos de comportamento e higiene (quem diria...). Eles ficaram noivos e o cão voltou a ter uma Mamãe como ele gostava de dizer. Até de vez em quando eles dormiam juntos, os três abraçadinhos.

  E assim, dois amigos voltaram a se conhecer e se amar. O homem saiu de seu buraco negro e profundo de tristeza, já o cão teve a companhia que merecia e que tanto presava.

  Aliás, eu acho que o cão é o herói da história. Eu deveria ter terminado dizendo que eu iria virar um supercão e ter várias cadelinhas,...errr...quer dizer...que o CãO viraria um super-herói.


  Bom, essa minha história, ops, história sobre esses amigos termina por aqui. Agora preciso conversar com uma certa pessoa que trouxe um gato pulguento pra casa...ARGH! Odeio aqueles felinos!



André Bludeni

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